Nos anos
2005-2009 o movimento mainstream do emo explodiu dentro do cenário da música
norte-americana trazendo à tona bandas de som pesado, na maioria das
vezes pop-punk com letras de alto teor emocional. Dentre essas bandas, uma se
destacou por ter como vocalista uma garota jovem de cabelos coloridos.
Rapidamente o que poderia ser apenas uma curiosidade provocada pelo machismo no
meio musical, principalmente no segmento do pop-punk, tornou-se um grande
sucesso comercial. Começava o sucesso da Paramore.
Dentre altos
e baixos, discussões internas, separações e hits emplacados, o grupo lançou
quatro álbuns de sucesso, dentre os quais, o Paramore (2013)
conseguiu alcançar o êxito de ganhar um Grammy de melhor música de rock por "Ain't fun" e já mostrava musicalmente um
parcial distanciamento do som que fez da banda conhecida.
Após mais
alguns desentendimentos e um quase rompimento total da banda devido a uma crise
interna causada pela saída nada amigável do baixista da banda Jeremy Davis,
Paramore ressurge das cinzas com uma nova formação, agora com a volta do Zac
Farro, membro e co-fundador da banda, trazendo um novo álbum lançado
mundialmente hoje, o "After
Laughter".
Mesmo para
quem escutou o "Paramore" (2013), "After Laughter" causa estranhamento. Enquanto que
no álbum auto-intitulado percebemos um momento de transição da banda, momento
este em que o pop é mais evidenciado, é em "After
Laughter" que a banda
abraça o universo pop de vez, deixando de forma quase abrupta o pop-punk que um dia os caracterizou.
"After
Laughter" é, antes de
tudo, um álbum que mora nos contrastes. A começar pelo título, que em tradução
livre seria "Depois da
risada", o álbum se
propõe a questionar sobre o que acontece em nosso rosto quando paramos de rir.
O que acontece quando nos damos conta que os tempos bons já se foram?
Enquanto que
sonoramente há uma aparente alegria causada pelos elementos de funk, pop e indie 80's na maioria das músicas, as letras
evidenciam tristeza, ceticismo e desesperança quanto aos relacionamentos e o
mundo, influenciados diretamente da depressão que Hayley Williams, vocalista e
principal compositora, luta contra.
"Hard
times" abre o disco
alegremente com uma sonoridade funk-pop 80's, apesar de contar um aviso de
toda a lírica do disco: "crescemos e estamos diante de obstáculos
difíceis, o que fazer a não ser aceitar a dor e vivê-la?".
"Rose
colored-boy" talvez seja
uma das que mais incomodaram as pessoas pela total desconexão sonora com o
legado da banda, porque o que ouvimos logo nos segundos iniciais soa quase como
alguma canção da Cindy Lauper, o que, particularmente eu adorei (apesar de
relutar no começo, admito.). A letra aborda alguém cansado de ser otimista,
mesmo que admitindo que gostaria muito de voltar a acreditar num mundo
bom.
"Told
you so" seguindo a
linha musical das demais: linhas de baixo de funk em evidência e pequenos arranjos
de guitarras com reverb, temos a interpretação nas partes altas que podem
causar saudades das explosões de raiva em hits como "Ignorance", por
exemplo.
"Forgiveness" é uma das grandes canções do
disco, na minha opinião. Abordando a dificuldade de perdoar e tendo consciência
dessa dificuldade (provavelmente inspirado na confusão que causou a saída de
Jeremy, que era um dos melhores amigos de Williams, inclusive), a canção traz
uma espécie de balada pop com elementos que causam balanceamento por
sintetizadores e guitarras com efeitos reverb (que são características de
bandas como The Smiths e The Cure).
Logo a
seguir vem outra grande canção do disco, inclusive preferida de muita gente, "Fake Happy". A canção inicia dando impressão de
ser uma balada lenta, mas volta ao pop-rock e pop oitocentista, com elementos
(principalmente no baixo) de funk-pop. A letra aborda a facilidade de fingir
estar feliz e sorrir para manter a imagem.
"26" é uma das minhas preferidas
por diversas razões: por quebrar com a linha sonora do álbum; por ser uma
balada com violões, o que pode lembrar a linda "Misguided
Ghosts" do álbum "Brand New Eyes"; por conter arranjos de cordas e
lira; por último, por possuir uma letra incrível, abordando sobre o doloroso
processo de crescer e se deparar com o fato de que a realidade não é tão boa quanto parece.
Logo após , temos a incrível"Pool", composição de Williams, York e Zac. O ar juvenil, alegre e que pode soar melodicamente com músicas pop anos 90 ou com o próprio Paramore no começo da carreira, traz uma letra que fala sobre o medo de mergulhar em relacionamentos depois de tantas decepções.
Enquanto que em Forgiveness há um relato de dificuldade em perdoar, em "Grudges", composição de Williams, York e Farro, os muros são quebrados, o ar passa ser menos denso por mostrar uma reconciliação entre amigos que se perdoaram e querem retomar de onde pararam, apesar de reconhecerem que agora tem de conviver com o fato de que não são mais os mesmos (talvez uma referência à reconciliação ocorrida entre Zac, Taylor e Hayley,): "Cause we can't keep holding on to grudges" (porque não se pode continuar guardando rancores).
A faixa é
iniciada com sintetizadores e depois abre para um indie delicioso que pode soar
como alguma da Phoenix ou com o retrô da Taking Heads.
"Caught in the middle" é uma canção honesta sobre não se enxergar tão jovem, mas ter dificuldades de se encontrar no que chamam de vida adulta. Um pop com bons arranjos de guitarra e contrabaixo, apesar de não ter chamado tanto minha atenção.
"Idle Worship" tem toques de indie-pop com uma interpretação "raivosa" de Williams (característica que a marcou), com certeza vai ser uma das melhores executadas ao vivo por sua energia. Soa como uma denúncia aos que se decepcionam por esperar de nós algo além do que somos, como a própria letra diz: "Oh, it's such a long and awful lonely fall/ down from this pedestal that you keep putting me on/What if I fall on my face?/What if I make a mistake?" (Oh, é uma longa e terrível queda solitária/ daqui desse pedestal que você continua me colocando/ E se eu cair de cara?/ E se eu cometer um erro?).
"No Friend" com certeza é a canção mais "difícil" do álbum, é completamente cantada pelo Aaron Weiss, vocalista da banda de rock experimental MewithoutYou e carrega muitas características dessa banda. Apesar de instrumentalmente ser incrível, trazer um aspecto sombrio interessante e possuir uma letra quase apocalíptica parecida com "Idle worship" (pelo que consegui captar), com certeza é a uma das poucas que não gostei por não sentir identificação pessoal e por achar incoerente quanto ao álbum.
Finalizando com chave de ouro, temos uma das melhores músicas do álbum, se não a melhor: "Tell me How". A canção é uma balada triste que continua com a carga emotiva lírica do disco sobre a dificuldade de perdoar, mesmo amando, a vontade de reconstruir pontes demolidas e a consciência do quanto que isso é difícil quando os corações estão cansados de recomeçar. É, definitivamente, uma canção dolorosa. (para quem entende a história da banda, é mais uma canção pessoal que provavelmente fala sobre os sentimentos da vocalista diante do rompimento com seu ex-melhor amigo Jeremy Davis).
"After Laughter" é um álbum que provavelmente trará muitas opiniões divididas quanto à coerência e identidade da Paramore diante de tantas mudanças musicais, internas e pessoais. Talvez a grande proposta seja exatamente a de, honestamente, levantar a questão sobre quem eles são enquanto músicos e fazer dos ouvintes co-participantes dessa redescoberta.
Ainda dentro
do álbum, pessoalmente senti falta de mais peso de guitarras, de mais
progressão em algumas músicas e um certo desconforto da própria Hayley Williams
diante de uma proposta musical diferente da que sua voz parece ser feita para
cantar. É contraditório termos letras tão pesadas sobre o medo de envelhecer,
ceticismo quanto às relações humanas, conformidade com a dor ao mesmo tempo em
que também temos melodias alegres e arranjos dançantes, mas talvez, ao mesmo
tempo o título do álbum seja uma tentativa de resposta a essas questões: o que
vem depois do sorriso? Como explicar momentos tão próximos e ao mesmo tão
distantes como o sorriso e a nossa expressão "after
laufhter" em que percebemos
que o tempo de sorrir acabou?
Sim, "After laughter" vai dividir opiniões, vai causar
desconforto nos que ouvem Paramore desde os primórdios, vai ser confundido como
uma mistura de referências retrôs, mas também poderá ser visto como uma tentativa
ousada e corajosa de se assumir como uma banda de pessoas que ainda estão
buscando suas identidades e dentro de todo esse processo, nos convidam para
crescermos juntamente com eles, e quando pensamos dessa forma, desde 2005,
nos vemos acompanhando essa jornada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário