Não faz muito tempo que tomei a consciência de minha cor e do que isso representa para minha identidade. Na verdade passei anos da minha vida me entendendo como simplesmente parda, mestiça nascida do encontro de um negro com uma branca, mas só recentemente algumas perguntas vieram ecoando à mente: o que é ser parda? O que ser "parda" significa? Na verdade, o que eu sou?
Quando percebi e olhei meus traços, meu cabelo, minha cor... Entendi que não possuo as marcas estruturais dos que "venceram" no mundo, a saber, os brancos.
Foi doloroso e ainda é sair de um estado de completa indiferença racial para uma consciência de que, sim, sou negra e de que todas as histórias terríveis que escutei sobre o sangue negro ter sido e ainda ser derramado no mundo e nesse país serem histórias sobre mim, sobre minha família, sobre gente que nem eu.
Nasci em uma família por parte de pai, completamente negra, mas igualmente machucada por esta identidade. Meus avós cresceram ouvindo o quanto eram odiados pela cor da pele, o quanto ser negro significava ser a pior das espécies, o bicho sem alma... Por autoproteção e completa assimilação desse discurso, protegeram seus filhos, netos e bisnetos da completa reconciliação consigo mesmo através da cor. Todos da linhagem da minha família carregam a cor, mas é doloroso, difícil, quase intragável de engolir o que isso representa para suas identidades. Cresci nesse meio.
Dear White People série original da Netflix levanta questões que mexem profundamente comigo, justamente por tocar nas bases estruturais de minha família e, consequentemente, de minha identidade ainda em construção.
A série aborda o racismo explícito e velado dentro de uma universidade de maioria branca e como cada pessoa negra resiste, sobrevive e se constrói apesar de viver em um mundo tão hostil. Cada episódio conta a história de uma dessas pessoas com todas as suas camadas de experiência, entrando questões de auto-estima, colorismo, gênero, religião, violência policial e, talvez, principalmente o racismo velado de brancos numa era ilusoriamente "pós-racial".
Apesar de, em termos de qualidade artística eu ter torcido o nariz e de esse ser um dos motivos pelos quais alguns dizem não ter gostado da série, por que será que mesmo com os mesmos problemas, 13 Reasons Why conseguiu chamar tanto a atenção das pessoas? Por que será que mesmo antes da estreia, o teaser recebeu tantas negativações? Que era "pós-racial" é essa que nos encontramos tão cheia de medo de ouvir sobre o sofrimento real de milhares de pessoas no mundo?
Talvez você que está lendo não tenha nascido dentro desse universo, não tenha sentido literalmente na pele o que é ser reduzido de sua humanidade, talvez não tenha ideia do que é se sentir feio por não estar dentro do padrão de beleza ou desde criança ter se sentido menos livre que os outros por não poder usar boné em estabelecimentos para não ser "confundido" com um bandido...
Dear White People não é fácil de assistir, não é fácil de assimilar, não é fácil de gostar, sobretudo se quem assiste sente-se embaraçado por se enquadrar nos personagens racistas da série.
Portanto, abro espaço nesse blog para convidar você, caro amigo preto e, principalmente, caro amigo branco, para se identificar, dolorosamente ou não com esta história.
Dear White People não é fácil de assistir, não é fácil de assimilar, não é fácil de gostar, sobretudo se quem assiste sente-se embaraçado por se enquadrar nos personagens racistas da série.
Portanto, abro espaço nesse blog para convidar você, caro amigo preto e, principalmente, caro amigo branco, para se identificar, dolorosamente ou não com esta história.
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