Há algo de bonito em conseguir enxergar os detalhes, as partes, na maioria das vezes, esquecidas aos olhos.
Eu sempre priorizei por perceber a fundamentação das coisas, o que carrega tudo, o que alimenta e define, mas nem sempre é reconhecido por isso.
Eu sempre priorizei por perceber a fundamentação das coisas, o que carrega tudo, o que alimenta e define, mas nem sempre é reconhecido por isso.
This is Us é uma série da NBC que anda fazendo muito burburinho pela sua excelência narrativa, técnica e, sobretudo emocional: é daquelas de arrancar lágrimas de quem assiste.
Mas é preciso dizer que essas lágrimas não escorrem como em um experimento behaviorista: mexendo aqui para ter como resposta isto aqui. Não. Nós sabemos o porquê nos emocionamos ao assistir a série. Aqui a ênfase está no cerne das nossas mais profundas emoções e definições como humanos: nossa família e quem nós somos e nos tornamos com essa intensa relação sanguínea, dolorosa, feliz e triste.
E em uma narrativa inteligente que mistura linhas temporais, acompanhamos a história da família Pearson na figura dos pais Jack e Rebecca e dos filhos Randall, Kevin e Kate. Cada personagem carrega sua própria história que vai sendo moldada pela complexidade das relações familiares, sobretudo em suas infâncias e adolescências como sementes para a vida adulta.
Randall é o rapaz adotado que, por ser negro, vê-se intensamente em uma profunda busca por quem é e por sua origem. Por esta razão é rodeado de amor pelos seus pais, o que provoca fendas em Kevin, filho mais extrovertido, exteriormente o mais "querido" de todos ao redor, mas que na verdade vê-se como em segundo plano no amor de seus pais, o que provoca vícios e uma autopercepção de nunca ser suficiente pra ser amado. Aliado a eles está Kate, única garota dos três filhos, que encontra na comida o refúgio para sua baixo auto estima, culpa e, por esta razão, desenvolve uma relação distante e difícil com sua mãe, mulher perfeita esteticamente que sempre a faz se sentir inferior.
Se eu perguntar pra qualquer pessoa que assiste This is Us o que mais chama a atenção na série, possivelmente, em muitos casos, um nome será citado: Jack Pearson.
Jack não é apenas o pai da família, mas torna-se o centro de quase todos os conflitos e elo de união entre todos. Jack é o homem que se doa, se sacrifica e possui um enternecimento nos olhos e um coração gigante ao ponto de fazer qualquer um se apaixonar ou vê em seu exemplo de humano uma maneira de ser melhor.
Com razão todos os louvores são dados a ele, mas dessa vez eu quero exaltar uma figura por vezes esquecida mas tão fundamental quanto Jack nessa história: Rebecca Pearson.
Rebecca foi a mãe que ousou colocar os filhos com os pés no chão; prepará-los para a dureza da vida e por vezes foi vista como a vilã em suas vidas.
Abandonou seus sonhos em ser uma cantora e mulher independente para doar sua vida inteira à disposição da criação dos filhos. Por esta razão sacrificou o ideal de uma mulher nos anos 80, com o coração explodindo de desejo pela liberdade das convenções sociais, desejando ser livre dos estereótipos de mãe, esposa e dona de casa para, por amor, enfim, aceitar os mesmos estereótipos que lutou contra em nome dos filhos e marido.
Apesar disso, era sob os ombros de Rebecca que as mágoas, os ressentimentos e conflitos dos filhos caiam. Jack acalmava a tempestade, Rebecca morava no olho do furacão.
Por muitas vezes vista como uma base, uma plataforma de sustento, e de alguma forma, não reclamando disso, as cortinas que se abrem para o show de amor da figura de Jack Pearson, Rebecca, de fato, não é vista como o centro da história Pearson, mas definitivamente sem ela, nada aconteceria.
Errou feio por muitas vezes e por excesso de amor feriu seus filhos, causando dor em Randall ao não lhe falar sobre seu pai, sua origem; não dando tanta atenção à Kevin por pensar com muito orgulho que ele não precisaria de tanto amparo quanto os outros filhos, por já ser corajoso suficiente, e sendo passiva-agressiva com Kate, mesmo que não se dando conta disso.
É definitivamente mais lógico exaltar a figura de Jack Pearson, o pai perfeito, o marido amoroso, que chega ao fim do dia e recolhe os destroços causados pela intensa relação da família com abraços ternos e um desejo de fazer com que todos se sintam melhores. É mais lógico o preferir e admito ser bem mais compreensível.
Eu, por mais que tenha demorado a perceber, e por mais que também não fuja do encanto de Jack Pearson, coração da família, percebo e entendo Rebecca, na verdade, como centro fundamental da mensagem de This is Us: é na sua perfeita imperfeição amorosa, na sua humanidade falha, na sua intensidade palpável, crível e percebida, na complexidade de suas emoções e ações sendo uma mãe real, que eu encontro acalanto. Porque é pensando em tudo isso que me dou conta que, sim, é possível ser real, ao ponto de nem ser idolatrado, e mesmo assim, ainda ser tão extraordinário quanto Rebecca Pearson.