sábado, 16 de julho de 2016

OUT OF EXILE - STRAHAN: DO EXÍLIO AO DESERTO

Eu não tenho muita facilidade com inglês, mas confesso que grande parte das músicas que ouço estão nesse idioma; não prestar tanta atenção nas letras (ou simplesmente não entendê-las à princípio) me faz focar mais na parte instrumental da obra e, talvez por isso, eu me apegue tanto aos arranjos, a melodia e a interpretação.
Contudo, sei da responsabilidade que a Arte exige porque sei que ela faz parte de uma cultura não totalmente redimida, e por esta razão, a letra é a mensagem e pode carregar traços negativos que vão de encontro ao que acredito. 
Este não é o caso de "Out of exile" do artista neozelandês Strahan. Sua música, em termos de gênero musical, se enquadra no indie-folk com leves toques de alt-country, mas sua confissão religiosa como cristão alivia essa preocupação que citei acima, já que suas letras expressam sua personalidade e consequentemente sua personalidade reflete Cristo se ele de fato for um cristão. 
Eu já tinha ouvido o primeiro disco de Strahan ("Posters") no ano passado, quando o conheci e já havia demonstrado encantamento pelo trabalho do rapaz (inclusive a canção "the time for a change again" me pegou de jeito tanto pela letra quanto pela sutil e doce melodia e interpretação), mas confesso que este segundo disco, "out of exile" está em todos os sentidos, superior a "posters". 
Á começar pelo título, que em tradução livre poderia significar "Fora do exílio" temos um caminho linear que vai do chamamento até ao direcionamento de onde se deve ir. Ora, a palavra "exílio" remete a um lugar que não é nosso, mas que serve como abrigo provisório; a preocupação temática pode revelar o desejo de libertação deste exílio, durante o álbum se perceberá tal concepção tanto no aspecto estético quanto nas letras.
Em comparação com o primeiro álbum, neste a escolha estética que marca esse tema de liberdade é a utilização mais forte das baterias e uma aproximação com as melodias do pop/rock e indie/rock.
A bateria se encontra presente de forma forte nas duas primeiras cançoes: "Hurricane love" (carro-chefe desse álbum) e "Raising boy". Refrões chiclete e animadores que dão aquela sensação de quando colocamos a cabeça para fora da janela de um carro em movimento. 
O álbum começa a entrar nos melhores momentos com a canção "Help me believe" uma das mais bonitas e tocantes do disco (entra no top 3 das mais bonitas pra mim, inclusive), abordando o tema da confiança em Deus em meio a uma crise de fé como se pode perceber nestes versos: "Tell me a story that I recognize/Would you touch my face/And help me believe/That the stories that I know for myself/Are not lies" (conte-me uma história que eu reconheça/você poderia tocar minha face/e me ajudar a acreditar/ que as histórias que eu sei por mim mesmo/não são mentiras". Que pancada de letra! Eu particularmente fico bem tocada com essa música porque acho que estamos sempre com essas crises de fé durante a nossa jornada e o quão difícil é fazer essas orações a Deus e admitir para nós mesmos que estamos em dúvida em relação a tudo que outrora acreditávamos. A fé é dom dEle, por isto parte dEle, nada mais justo - e talvez mais doloroso - do que reconhecer que sozinhos só temos a tendência de desacreditar em tudo o que ouvimos e partir deste reconhecimento clamar pela ajuda do Doador da Fé. 
Mais na frente, o refrão revela uma espécie de grito desesperado: "Cause I have seen/Heavens doors open to me/I have shook to the bones/And I have seen your face as I lay on the floor/And I have cried/And I have sought/Like a beggar in my soul/Like a beggar in the world just to find you Lord" (Porque eu vi/ As portas do céu abrirem para mim/o tremor do balançar dos ossos/E eu vi seu rosto enquanto estava deitado no chão/e eu chorei/e eu tenho procurado/como um mendigo na minha alma/como um mendigo no mundo, só para encontrar Você, Senhor". O que fazer quando a falta de fé acontece mesmo quando já se teve provas suficientes do poder e presença de Deus? Este é o maior desespero. A crise de fé também é uma das grandes sedes por Deus que nos arrebatam em muitos momentos da vida. "Like a beggar". 
A partir de "Help me believe" temos a presença mais forte dos violões e de riffs "arrastados" (muito comuns em músicas country) assim também como de órgãos na música "Out of exile". A letra desta música, inclusive, revela algo interessante sobre a temática do álbum todo: "I’m calling to you/Come back from the woods/Come out of exile." (eu estou chamando você/ volte da floresta/saia do exílio" O começo da canção nos leva a um mundo de pessoas vazias, sedentas por sangue, pessoas que não querem amor, não querem paz, só querem guerra; essas pessoas são as que se encontram no "exílio", alguém que não é do exílio não pode ser como essas pessoas, por isso há o convite: saia do exílio, volte para o seu lugar. 
"Call me" serve como quebra deste clima de reflexão trazidos pelas duas últimas canções. Se em "out of exile" há um convite da parte de alguém (que pode ser o próprio Deus) para deixar o exílio em termos de identidade, já que somos estrangeiros, em "call me" há um pedido feito pelo exilado para que Deus o liberte deste exílio e o faça se sentir seguro, mesmo que a libertação não tenha, efetivamente, chegado. Leve e com um solo lindo de gaita, esta canção é mais uma das descritas para colocar a cabeça para fora numa viagem de carro. 
"Hello heaven" traz de volta o clima reflexivo e doce esteticamente com a bateria pop e a presença dos violões e piano. A letra da canção expressa como os vislumbres da eternidade neste mundo de tanta informação e caos servem como bálsamo para uma alma desesperada. "The current of your love leads me to the shore/Now I’m believing, now I’m believing/That you love to call me son" (A corrente do Seu amor me leva para à praia/agora eu estou acreditando, agora eu estou acreditando/que você gosta de me chamar de filho); esta certeza é o que nos mantém de pé aqui.
E, enfim, chegamos a música que, na minha opinião, é a mais sufocante de tão bonita, tocante e arrepiante: "Need you". Com a presença de violões, cordas de violino e violoncelo e uma interpretação visceral do Strahan, temos um pedido de socorro, uma verdadeira oração cantada: "The shadows I hide are the shadows that bind me/These dark corners becoming the walls that define me/And with this weight on my heart I don’t know what to do/But I know that I need you" (As sombras que me escondem são as sombras que me ligam/Estes cantos escuros tornando-se paredes que me definem/e com este peso em meu coração, não sei o que fazer/mas eu sei que eu preciso de Você" agora mesmo ao escrever esta análise, estou me arrepiando e com os olhos cheios de lágrimas ao ouvir esta canção. A única certeza que temos em momentos difíceis da vida é que precisamos dEle. Não apenas você, Strahan.
Como já demonstrado antes, a dinâmica do disco exige algo mais leve logo após uma enxurrada de lágrimas, e assim aparece "Satisfied" com sua alegre instrumentalização de gaitas, violões e palmas para mostrar a satisfação de alguém que tem a Deus independente de todas as coisas. Como sou apaixonada por gaitas, posso dizer que é uma ótima canção para se dançar na chuva logo após ter enxugado as lágrimas por ter escutado "need You". 
Após a alegria contagiante de "Satified" o disco fecha com "Wilderness", uma canção reflexiva que contrasta com "out of exile" tematicamente. Se em "Out of exile" há um chamado para sair da floresta, do exílio, em "wilderness" há um chamado para ir ao deserto. Seria contradição? 
Na verdade, se formos perceber todo caminho traçado pelo álbum, as ideias são, na verdade, complementares. Deus nos convida para sair do exílio no sentido da identidade, porque ainda estamos em terras estrangeiras, porém não pertencemos a este lugar. Sair do exílio é assumir-se como estrangeiro, mesmo em terras que não lhe pertencem. "Wilderness" em contrapartida, revela o objetivo de uma vida redimida: a vida voltada para o outro. Não somos redimidos para apenas viver como estrangeiros, mas também para irmos ao deserto, preparar o caminho do Senhor, tal qual João Batista, e consolar os que choram e libertar os cativos. 
Se é este o contraste do Evangelho, que o vivamos: saiamos do exílio com destino ao Deserto até pisarmos em terra firme no nosso Lar. 



Nota: 4,5/5

Um comentário:

  1. muito bom o seu artigo...me fez refletir em muitas coisas! Deus a abençoe!

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